A atuação na Justiça do Trabalho impõe o conhecimento do Direito do Trabalho. Todavia, é também fundamental o domínio do Direito Processual do Trabalho, para que os interesses dos seus clientes sejam absolutamente preservados.
Analisaremos os aspectos processuais e materiais relativos ao caso proposto.
1. DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO
1.1 Resposta da reclamada (ré) no Direito Processual do Trabalho
Iniciar um processo trabalhista demanda, em primeiro lugar, uma compreensão aprofundada dos termos utilizados para se referir às partes envolvidas. A parte que move a ação é identificada como o “reclamante”, enquanto a parte contra quem a ação é dirigida é denominada “reclamado(a)”.
Outro aspecto crucial é a consciência da garantia constitucional de responder às alegações contidas na petição inicial (direito ao contraditório e ampla defesa), conforme consagrado no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal de 1988. Isso implica que a parte reclamada tem a oportunidade de, neste momento processual, apresentar argumentos e provas que contraponham as alegações do reclamante. Também, é a etapa adequada para a anexação de documentos que se revelem essenciais para a resolução da controvérsia.
Embora o Direito Processual do Trabalho adote o princípio da oralidade, permitindo a apresentação oral da peça processual durante a audiência, é altamente recomendável que a peça seja elaborada de forma escrita, preferencialmente no sistema PJe (Processo Judicial Eletrônico), antes do início da audiência, conforme previsto no art. 847 da CLT. Tal abordagem possibilita uma exposição técnica e incisiva dos argumentos destinados a defender os interesses da parte representada.
Importante frisar que negar simplesmente os fatos alegados na petição inicial não é uma estratégia adequada. É essencial articular de maneira sólida os elementos fáticos e jurídicos, com o objetivo de refutar as alegações do reclamante, evitando, assim, a confissão, ou seja, a presunção de veracidade dos fatos narrados na petição inicial, conforme prescrito no art. 341 do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, que se aplica subsidiariamente ao Direito Processual do Trabalho com base no art. 769 da CLT.
Não existe na CLT uma regra específica para a organização da peça processual no âmbito do Direito Processual do Trabalho. Entretanto, a organização da peça deve refletir uma sequência lógica e clara. Por exemplo, se houver uma preliminar de incompetência em razão da matéria, ou seja, se a Justiça do Trabalho não for competente para processar e julgar o caso, essa questão deve ser abordada antes do mérito. A estrutura da peça deve seguir a mesma ordem em que o julgador decidirá: competência primeiro, mérito em seguida. O mesmo se aplica na hipótese de uma prejudicial, como é o caso da prescrição e decadência, essas alegações devem ser apresentadas antes do mérito.
As preliminares tratam de questões relacionadas ao procedimento e podem levar à extinção do processo sem análise do mérito. Quando o mérito é abordado, o foco recai sobre o direito material subjacente. Nesse contexto, a organização da peça processual deve refletir essa lógica, com tópicos dedicados a cada questão específica, como “prescrição” ou “equiparação salarial”.
Para facilitar a compreensão, a seguir, apresentamos um mapa mental da tramitação de uma reclamação trabalhista na primeira instância.
Fonte: elaborada pelo autor.
Quando uma reclamação trabalhista é distribuída, ocorre o seu encaminhamento para uma Vara do Trabalho por meio de sorteio. Nesse procedimento, é atribuído um número ao processo e, geralmente, uma audiência é designada.
Após a distribuição, a parte reclamada é oficialmente comunicada pela Justiça do Trabalho sobre a existência da ação, por meio da citação. Esse comunicado informa o procedimento em andamento, detalhando a data e o horário da audiência que será realizada.
É importante ressaltar que o Direito Processual do Trabalho é fundamentado na noção de que os reclamantes, geralmente, têm menos recursos, sendo caracterizados como parte hipossuficiente no processo. Por essa razão, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) contempla disposições que visam equilibrar essa disparidade, como inversões de ônus da prova e presunções legais.
Um aspecto crucial a considerar é a necessidade de acompanhar as mudanças na legislação trabalhista, que ocorrem com frequência. Essas alterações podem afetar substancialmente o desfecho dos processos trabalhistas.
Além disso, é fundamental entender os prazos para a apresentação da contestação e determinar o momento adequado para anexar documentos relevantes ao processo, de acordo com o art. 847 da CLT.
2. DIREITO DO TRABALHO
Agora, verificaremos os principais pontos do Direito do Trabalho para a elaboração da peça processual adequada.
2.1 Terceirização – vínculo de emprego
A alegação de João é que houve fraude à terceirização, ou seja, que no caso concreto ocorreu o fenômeno da “pejotização”.
Para refutar este pedido, você precisa lançar mão dos aspectos fáticos que podem afastar a existência de ao menos um dos requisitos da relação de emprego, que estão elencados no art. 3º da CLT. A pessoalidade é um destes requisitos, e impede que o trabalhador seja substituído por qualquer outra pessoa, sendo o serviço prestado exclusivamente por determinado agente.
Embora a exclusividade não constitua um dos requisitos da relação de emprego, o fato de prestar concomitantemente serviços a vários tomadores também pode enfraquecer a tese obreira.
Estratégia de defesa que pode ser utilizada, embora não tenha significativa aceitação nos Tribunais do Trabalho, diz respeito à prevalência do que foi ajustado entre os contratantes, em consagração à boa-fé objetiva prevista no art. 422 do Código Civil, e à autonomia da vontade. A inexistência de vício de consentimento no momento da celebração contratual é um argumento que não pode ser deixado de lado na peça a ser elaborada. Para melhor elucidar a tese defensiva, sugere-se a leitura do acórdão proferido pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, nos autos de nº 0000662- 25.2017.5.10.0014, que pode ser acessado no seguinte link:
https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-10/1138376617/inteiro-teor-1138376657
2.2 Verbas rescisórias
O deferimento das verbas rescisórias postuladas é consectário da procedência do pedido de reconhecimento do vínculo de emprego.
Neste contexto, como a postulação não contém equívoco, não há que se combater as verbas rescisórias elencadas na petição inicial, assim como as obrigações de fazer, sendo necessário apenas o requerimento de improcedência, uma vez que a existência de vínculo empregatício será refutada na peça processual.
2.3 Multa do art. 477, §8º, da CLT
João da Silva requer a condenação da reclamada ao pagamento da multa prevista no art. 477, §8º, da CLT, invocando o entendimento contido na Súmula nº 462 do TST, segundo o qual o reconhecimento em juízo do vínculo de emprego não afasta a incidência da multa.
Em que pese a existência de Súmula do TST, a matéria pode e deve ser debatida em juízo, haja vista que ela não tem caráter vinculante.
O argumento jurídico a ser explorado é que o vínculo empregatício é controverso, sendo que a previsão de incidência do próprio art. 477, §8º, da CLT, é aplicação de multa quando as verbas rescisórias incontroversas não forem quitadas no prazo legal.
A este respeito sugere-se a leitura do acórdão prolatado pelo Egrégio Regional do Trabalho da 2ª Região nos autos de nº 1002117-49.2017.5.02.0719, que pode ser acessado pelo seguinte link:
https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-2/1392942522/inteiro-teor-1392942572
2.4 Dispensa discriminatória
O reclamante alega que seu contrato foi rompido em virtude de discriminação decorrente do fato de estar acometido com câncer de próstata. Requer, assim, a condenação da reclamada ao pagamento, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais até a sentença, assim como indenização por danos morais.
É cediço que a dispensa de pessoa com doença estigmatizante é presumida como discriminatória. Todavia, trata-se de presunção relativa, ou seja, que admite prova em sentido contrário.
As informações prestadas pelo representante legal da reclamada são valiosas neste sentido, em especial, o fato de o encerramento contratual ter se dado pelo término do “Projeto Alfa” para o qual foi contratado. Houve, portanto, motivação distinta para o encerramento contratual.
2.5 Honorários advocatícios e justiça gratuita
O trabalhador requer a condenação ao pagamento de honorários advocatícios de sucumbência, com fundamento no disposto no art. 791-A da CLT.
O argumento a ser utilizado é que a improcedência total dos pedidos não enseja a condenação ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais.
No que diz respeito ao direito do advogado das reclamadas de receber honorários advocatícios, não há defesa a ser formulada, eis que o obreiro preenche os requisitos legais para o deferimento da justiça gratuita e, consequentemente, para a suspensão da sua exigibilidade em caso de improcedência.
Quadro 1 | Quadro sinótico da legislação e jurisprudência consolidada aplicável (referidos e não referidos nas explicações anteriores)
Fonte: elaborado pelo autor.