Apesar de ser uma máxima de que ninguém deve ser preso antes do trânsito em julgado, é sempre de bom alvitre citar a Constituição Federal em seu art. 5°, LVII, destacando-se o princípio da presunção de inocência ou não culpabilidade, nesses termos: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (Brasil, 1988, [s. p.]).
Esse mandamento constitucional deixa claro que a prisão somente deve ser feita em último caso, não podendo haver a inversão de valores fundamentais, sendo a liberdade uma exceção, e a restrição da liberdade, algo corriqueiro. Esse pensamento é extremamente danoso e cria um ar sombrio na sociedade.
Essa linha de pensamento perpassa a prisão preventiva, que possui natureza cautelar, pressupondo a existência de periculum libertatis e fumus comissi delicti, como bem ensina o Professor Avena, in verbis:
Como qualquer medida cautelar, a preventiva pressupõe a existência de periculum in mora (ou periculum libertatis) e fumus boni iuris (ou fumus comissi delicti), o primeiro significando o risco de que a liberdade do agente venha a causar prejuízo à segurança social, à eficácia das investigações policiais/apuração criminal e à execução de eventual sentença condenatória, e o segundo, consubstanciado na possibilidade de que tenha ele praticado uma infração penal, em face dos indícios de autoria e da prova da existência do crime verificados no caso concreto. (Avena, 2020, p. 1054)
O art. 312 do CPP demonstra os requisitos necessários para a realização da prisão preventiva, nesses termos:
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.
Nesse diapasão, antes de adentrar nos requisitos pertinentes à decretação da prisão preventiva, o juiz deverá ter certeza da existência do crime, indícios suficientes de autoria e a novidade legal imposta pelo perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado, pressupostos fundamentais para a sua imposição. Nas palavras por mim elencadas na obra OAB Esquematizado:
Como pressupostos da prisão preventiva tem-se o que se convencionou chamar de fumus comissi delicti e periculum libertatis. O primeiro é a possibilidade de o agente ter cometido a infração penal, consubstanciado na prova da existência do crime (PEC) e nos indícios suficientes de autoria (ISA). (Gonzaga, 2022, p. 674)
Na sistemática do Código de Processo Penal, urge a conjugação clara de seus pressupostos legais (prova da existência do crime, indícios suficientes de autoria e perigo gerado pelo estado de liberdade do acusado) e de um dos requisitos também inseridos no citado art. 312 do CPP, tais como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal.
Como novidade inserida pelo Pacote Anticrime, tem-se a expressão “perigo gerado pelo estado de liberdade do acusado”. Esse pressuposto denota que a liberdade do acusado possa comprometer a segurança da sociedade, o que ocorre em casos de pessoas com alto grau de periculosidade, por exemplo, líderes de facções criminosas. Tal situação deve ser cabalmente comprovada com elementos concretos dos autos, não bastando a simples alegação de que ele é perigoso e, por isso, deve ficar recolhido.
De forma a tornar clara a questão acerca da novidade legal inserta pela expressão “perigo gerado pelo estado de liberdade do acusado”, destaca-se o escólio na já citada obra OAB Esquematizado, nesses termos:
Percebe-se que o intuito do legislador foi positivar uma situação que os Juízes comumente utilizavam como ‘garantia da ordem pública’ para justificar a prisão preventiva de pessoas consideradas perigosas. Com a nova redação, acaba-se a celeuma jurídica, e os casos de acusados considerados socialmente perigosos poderão ser encaixados na parte final do artigo em comento. (Gonzaga, 2022, p. 675)
Ainda dentro do primeiro requisito consistente na garantia da ordem pública, a doutrina majoritária critica esse requisito autorizador da medida cautelar, pois o conceito de tal expressão é bastante amplo. Para alguns doutrinadores, como Leonardo Barreto Moreira Alves (2019, p. 117), “violam a ordem pública: aqueles que afetam a credibilidade do judiciário; os que contam com a divulgação pela mídia (não confundir com sensacionalismo, clamor público); os crimes cometidos com violência ou grave ameaça ou com outra forma de execução cruel; se o agente delitivo possui longa ficha de antecedentes etc.”.
Necessita-se de uma fundamentação feita com os elementos concretos dos autos, demonstrandose, exaustivamente, que a liberdade do indivíduo coloca a ordem pública em perigo, não bastando imputação de elementos abstratos, como a hediondez do delito ou a gravidade abstrata do crime. Nesses termos, é o pensamento do Superior Tribunal de Justiça:
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. CONVERSÃO DA PRISÃO EM FLAGRANTE EM CUSTÓDIA PREVENTIVA. MOTIVAÇÃO INSUFICIENTE. PERICULUM LIBERTATIS NÃO EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA.
1. A prisão preventiva é compatível com a presunção de não culpabilidade do acusado desde que não assuma natureza de antecipação da pena e não decorra, automaticamente, do caráter abstrato do crime ou do ato processual praticado (art. 313, § 2º, CPP). Além disso, a decisão judicial deve apoiar-se em motivos e fundamentos concretos, relativos a fatos novos ou contemporâneos, dos quais se possa extrair o perigo que a liberdade plena do investigado ou réu representa para os meios ou os fins do processo penal (arts. 312 e 315 do CPP).
2. Não foram indicados, pelo Juízo singular, elementos idôneos para convolar a prisão em flagrante em custódia provisória, uma vez que se limitou a afirmar a gravidade abstrata e a hediondez do delito imputado à acusada.
3. A simples leitura do decisum combatido permite verificar que ficou consignado que a droga apreendida pertencia à irmã da paciente – fato admitido pelas duas autuadas, ao prestarem depoimento em âmbito policial.
4. Ordem concedida para confirmar a liminar tornar sem efeito a decisão que converteu a prisão em flagrante do acusado em custódia preventiva, ressalvada a possibilidade de nova decretação da medida caso efetivamente demonstrada a sua necessidade, sem prejuízo de fixação de cautelar alternativa, nos termos do art. 319 do CPP (HC 597376 / SP, STJ).
O segundo requisito é para garantir a ordem econômica. In casu, deve ficar comprovado que a liberdade do acusado possa gerar um grave abalo à ordem econômica. Todavia, essa forma de prisão cautelar é totalmente genérica e de difícil constatação no caso concreto, muito em razão de ser bem parecida com a garantia da ordem pública.
A par de ilustrar, citam-se os crimes de sonegação fiscal com cifras exponenciais, lavagem de capitais praticada por meio de uma avançada engenharia econômica de forma a ocultar valores estratosféricos desviados de empresas públicas ou graves fraudes em licitações públicas que possam comprometer toda a estabilidade social local.
No sentido da inocuidade do requisito, Nestor Távora e Osmar Rodrigues (2019, p. 984) prelecionam: “(…) afinal, havendo temor da prática de novas infrações, afetando ou não a ordem econômica, já haveria o enquadramento na expressão maior, que é a garantia da ordem pública”.
O terceiro requisito consiste na garantia da instrução criminal. Nesse ponto, a lei prevê a possibilidade de prisão preventiva de alguém que esteja desafiando a produção probatória, ameaçando testemunhas ou destruindo provas. Mais uma vez, é bom lembrar que tais situações devem ser concretamente comprovadas nos autos.
Como último requisito, a prisão pode ser decretada para garantia da aplicação da lei penal. In casu, a possibilidade de prisão preventiva diz respeito àquela situação em que o agente evade e reste difícil o cumprimento da penalidade a ele imposta no final do processo.
Logo, a invocação da gravidade em abstrato do crime e a hediondez do delito não constituem motivos suficientes para a decretação dessa medida extrema.
Lado outro, inovando-se no Código de Processo Penal, o Pacote Anticrime estabeleceu ser a prisão cautelar medida extrema, ou seja, antes de decretar o encarceramento do indivíduo, cumpre ao magistrado estudar a possibilidade de decretar medidas cautelares diversas da prisão, caso sejam suficientes para proteger o bem jurídico protegido e o resguardo do devido processo legal, sendo que essas cautelares estão dispostas no art. 319 do CPP:
Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:
I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;
II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;
III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;
IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;
V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;
VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;
VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semiimputável e houver risco de reiteração;
VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;
IX – monitoração eletrônica.
Outra observação relevante para fins de análise da prisão preventiva é a regra inscrita no art. 316 do CPP, determinando-se ao juiz a necessidade de revisão da prisão preventiva decretada após o decurso do prazo de 90 dias, sob pena de ela ser classificada como ilegal, nesses termos:
Art. 316. O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar a falta de motivo para que ela subsista, bem como novamente decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.
Trata-se de regra importante para que não persistam as famigeradas prisões sem prazo, em que o acusado permanecia preso à totalidade da persecução penal sem qualquer fundamentação robusta, não havendo, ainda, nenhuma revisão do decreto prisional. Com a novel modificação legal, o juiz que decretou a prisão preventiva deverá atentar-se, após o prazo de 90 dias, para a necessidade ou não de sua manutenção, conforme exposto no livro OAB Esquematizado, in verbis:
Uma última observação acerca desse tema é a novidade inserida no parágrafo único do art. 316, CPP, em que se exige do Juiz, de ofício, a necessidade de revisar a prisão preventiva decretada a cada 90 dias, justificando a sua manutenção com os elementos concretos constantes dos autos. Trata-se de mais uma conquista da Advocacia para que não se perpetuem prisões sem maiores fundamentações e apenas de forma automática. (Gonzaga, 2022, p. 677)
Pelo dispositivo legal e pela visão jurisprudencial, o Magistrado que decretou a prisão preventiva deve analisar se os pressupostos e requisitos da prisão preventiva subsistem para fins de manutenção da custódia cautelar, devendo ser observado o prazo legal de 90 dias.
Por fim, quando há necessidade de perícia em arma de fogo e em drogas, o mandamento legal é imperioso no sentido de ser realizada a perícia para fins de constatar a prestabilidade da arma de fogo e que o material apreendido de fato constitui droga.
Nesse espeque, cita-se o art. 158 do Código de Processo Penal, que assim elucida a questão:
Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado. Parágrafo único. Dar-se-á prioridade à realização do exame de corpo de delito quando se tratar de crime que envolva: (Incluído dada pela Lei nº 13.721, de 2018)
I – violência doméstica e familiar contra mulher; (Incluído dada pela Lei nº 13.721, de 2018)
II – violência contra criança, adolescente, idoso ou pessoa com deficiência. (Incluído dada pela Lei nº 13.721, de 2018)
Ademais, cumpre ressaltar que a Lei de Drogas exige a realização de dois laudos periciais para satisfazer o devido processo legal, sendo indispensáveis os laudos preliminares ou de constatação e o definitivo, uma vez que a ausência de um dos dois laudos ocorre situação de nulidade absoluta
Trata-se da disposição prevista nos arts. 50 e seguintes, a seguir transcritos:
Art. 50. Ocorrendo prisão em flagrante, a autoridade de polícia judiciária fará, imediatamente, comunicação ao juiz competente, remetendo-lhe cópia do auto lavrado, do qual será dada vista ao órgão do Ministério Público, em 24 (vinte e quatro) horas
§ 1º Para efeito da lavratura do auto de prisão em flagrante e estabelecimento da materialidade do delito, é suficiente o laudo de constatação da natureza e quantidade da droga, firmado por perito oficial ou, na falta deste, por pessoa idônea.
§ 2º O perito que subscrever o laudo a que se refere o § 1º deste artigo não ficará impedido de participar da elaboração do laudo definitivo.
§ 3º Recebida cópia do auto de prisão em flagrante, o juiz, no prazo de 10 (dez) dias, certificará a regularidade formal do laudo de constatação e determinará a destruição das drogas apreendidas, guardando-se amostra necessária à realização do laudo definitivo. (Incluído pela Lei nº 12.961, de 2014)
§ 4º A destruição das drogas será executada pelo delegado de polícia competente no prazo de 15 (quinze) dias na presença do Ministério Público e da autoridade sanitária. (Incluído pela Lei nº 12.961, de 2014)
§ 5º O local será vistoriado antes e depois de efetivada a destruição das drogas referida no § 3º, sendo lavrado auto circunstanciado pelo delegado de polícia, certificando-se neste a destruição total delas. (Incluído pela Lei nº 12.961, de 2014)
Art. 50-A. A destruição de drogas apreendidas sem a ocorrência de prisão em flagrante será feita por incineração, no prazo máximo de 30 (trinta) dias contado da data da apreensão, guardando-se amostra necessária à realização do laudo definitivo, aplicando-se, no que couber, o procedimento dos §§ 3º a 5º do art. 50. (Incluído pela Lei nº 12.961, de 2014)
Não é com outro pensamento que a jurisprudência exige perícia nesses dois tipos de crimes, nesses termos:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PORTE ILEGAL DE MUNIÇÕES DE USO PERMITIDO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 14 DA LEI 10.826/2003 E 386, III, DO CPP. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. MUNIÇÕES ISOLADAMENTE CONSIDERADAS. COMPROVAÇÃO DA LESIVIDADE. MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA. MUNIÇÕES APREENDIDAS EM VIA PÚBLICA. CRIME DE MERA CONDUTA. TIPICIDADE CONFIGURADA. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. ALTERAÇÃO DO QUANTO DISPOSTO NO ACÓRDÃO. NECESSIDADE DE REEXAME DO ARCABOUÇO FÁTICOPROBATÓRIO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ.
1. No que se refere ao pleito de afastamento do óbice da Súmula 7/STJ, visando a absolvição do agravante, o Tribunal de origem dispôs que a materialidade do crime do artigo 14 do Estatuto do Desarmamento está comprovada pelo auto de prisão em flagrante delito (fls. 02/08-v), pelo boletim de ocorrência (fls. 10/21-v), pelo auto de apreensão (fl. 26) e pelo laudo pericial de eficiência e prestabilidade das munições (fl. 85). […] O acusado admitiu perante a autoridade policial ter sido preso “portando uma arma de fogo calibre .38 municiada com dois cartuchos” (fl. 06). Em juízo, ele exerceu seu sagrado direito constitucional de permanecer em silêncio (audiência audiovisual – CD de fl. 208). […] A confissão extrajudicial do réu foi confirmada em juízo pelo policial militar Marcelo Gonçalves da Silva, que relatou que apreendeu com o apelante um revólver calibre 38 com duas munições (mídia de fl. 208).
2. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais destacou, ainda, que para a tipificação do delito do artigo 14 da Lei 10.826/03, crime de perigo abstrato ou de mera conduta, basta a probabilidade de dano; não é necessária sua efetiva ocorrência. Entretanto, o simples fato de o crime de porte de munições de uso permitido ser de mera conduta ou de perigo abstrato não significa que é prescindível a realização de laudo pericial para aferir a eficiência e prestabilidade delas. Ou seja, é necessário atestar que as munições são aptas a ofender a incolumidade pública, independentemente de tal resultado ocorrer. […] No caso em tela, a despeito de o laudo de fls. 81/82 não ter constatado a eficiência e a prestabilidade da arma de fogo, o laudo de fl. 85 constatou a eficiência e a prestabilidade das duas munições calibre 38 que foram apreendidas com o acusado. Ou seja, elas eram capazes de ofender a integridade física de alguém. […] O bem jurídico tutelado pelo Estatuto do Desarmamento é a incolumidade pública, o que transcende a mera proteção à incolumidade pessoal, abrangendo a garantia e preservação do estado de segurança.
3. Para revisar o aferido pela Corte de origem, seria necessária a incursão em aspectos de índole fático-probatória, medida essa inviabilizada na via eleita pela incidência do óbice constante da Súmula 7/STJ.
4. Para o Superior Tribunal de Justiça, há tipicidade na conduta do porte de munição de arma de fogo, ainda que desacompanhada de artefato bélico
5. A particularidade descrita no combatido aresto, atinente à apreensão das munições em via pública, demonstra uma maior reprovabilidade da conduta do agravante, o que impossibilita, no caso, o reconhecimento da atipicidade material de sua conduta.
6. Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal, o simples fato de possuir arma de fogo, mesmo que desacompanhada de munição, acessório ou munição, isoladamente considerada, já é suficiente para caracterizar o delito previsto no art. 14 da Lei n. 10.826/2003, por se tratar de crime de perigo abstrato. Nesse contexto, é irrelevante aferir a eficácia da arma de fogo/acessório/munição para a configuração do tipo penal, que é misto-alternativo, em que se consubstanciam, justamente, as condutas que o legislador entendeu por bem prevenir, seja ela o simples porte de munição, seja o porte de arma desmuniciada
7. A conclusão do aresto impugnado está em sintonia com a orientação jurisprudencial desta Corte quanto à tipicidade da conduta de porte ilegal de munição desacompanhada de arma de fogo (EREsp n. 1.853.920/SC, Ministro Joel Ilan Paciornik, Terceira Seção, DJe 14/12/2020).
8. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 1544853 / MG, STJ)
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. APREENSÃO DE DROGA. AUSÊNCIA DE CONSTATAÇÃO INEQUÍVOCA. MATERIALIDADE DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS AFASTADA. ABSOLVIÇÃO. ART. 580 DO CPP. EFEITOS EXTENSIVOS. DOSIMETRIA DO CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PENA-BASE E AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. PROPORCIONALIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. EFEITO EXTENSIVO
1. “É imprescindível para a demonstração da materialidade do crime de tráfico a apreensão de drogas” (REsp 1865038/MG, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 25/8/2020, DJe4/9/2020). Ainda que ausente apreensão de droga em poder do acusado, mas sendo apreendido entorpecente em poder de corréu e havendo existência de liame subjetivo entre os agentes, devidamente comprovado, torna-se descabida a pretensão de afastamento da materialidade do crime do art. 33 da Lei 11.343/2006, hipótese que não se ferpaz no caso
2. As instâncias ordinárias deixaram de indicar, de forma inequívoca, se houve apreensão de entorpecente em poder de algum dos acusados, tendo a condenação pelo crime do art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, se dado somente com apoio em relatório investigativo, no qual foram reproduzidas conversas extraídas de aparelhos celulares, e na prova testemunhal obtida sob o crivo do contraditório, elementos que, na ausência de laudo de exame toxicológico, ainda que preliminar, não se mostram suficientes para fundamentar a condenação, por cuidar-se de crime material (art. 50, §§ 1º a 3º – Lei 11.343/2006)
3. A lei não fixa parâmetros aritméticos para a exasperação da pena-base ou para a aplicação de atenuantes e de agravantes, cabendo ao magistrado, utilizando-se da discricionariedade motivada e dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, fixar o patamar que melhor se amolde à espécie.
4. No caso, a pena-base sofreu acréscimo de cerca de 1/5 do intervalo entre as penas máxima e mínima abstratamente cominadas ao delito do art. 35 da Lei 11.343/2006 para cada circunstância judicial desfavorável, considerando os maus antecedentes do acusado, que ostenta várias condenações, e as circunstâncias do crime (posição de liderança em associação criminosa, com atuação em pelo menos 3 municípios, que permitiu comercialização de drogas e movimentação de recursos financeiros expressivos), o que não se mostra desarrazoado. Não se revela desproporcional o aumento de 1/3, na segunda fase da dosimetria, em razão da dupla reincidência
5. Agravo regimental parcialmente provido. Absolvição pelo crime do art. 33 da Lei 11.343/2006 (art. 386, VII – CPP), com efeito extensivo (art. 580 – CPP), mantido o restante da condenação (AgRg no HC 671058 / SC, STJ).
Pelo que se observa, nos crimes que deixam vestígios, a necessidade do laudo pericial é fundamental, de forma a comprovar a existência da materialidade delitiva.
Um detalhe relevante é que, nos crimes dolosos contra a vida, como ocorre com o homicídio, a competência para julgar todos os delitos conexos é do Tribunal do Júri, daí sendo relevante direcionar
A regra é a liberdade, sendo a prisão provisória espécie excepcional no ordenamento jurídico brasileiro.
a peça processual para esse juízo específico, na forma do art. 78, I, do CPP.